“Assim será a nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos –
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.”
[Vinícius de Moraes. Excerto de “Poema de Natal”]
Aos poucos vamos perdendo o brilho,
o viço, o prazer no cotidiano e
as coisas vão tendo um olhar blasé.
Aprendi que os anos passam
e nos tornamos mais exigentes
e, com isso, a felicidade vai se esvaindo.
Não me culpo pela mensagem não enviada,
pelo beijo não dado ou pelo abraço inexistente.
No fundo, somos todos iguais: deixamos para depois.
Mal sabemos que não há depois.
O amanhã pode não existir e
que nós mesmos iremos morrer.
Nesse intervalo, envelhecemos, vamos
ficando frágeis e debilitados até dependermos
novamente de alguém como no início.
Um ciclo infindo: nascer, viver, morrer.
Tudo isso sem se saber quando e por quê.
Há perguntas sem respostas. Mistério.
Os remédios fazem-me efeito por um
curto período de tempo, depois parecem placebos
e nesses hiatos a vida é intolerável.
Desisti abandonar este corpo que habito,
deixar esta alma (se é que ela existe) livre,
abandonar esta vida que me foi dada.
Espero a sorte de ter uma partida breve,
indolor, sem tempo para lágrimas,
lamúrias ou longas despedidas.
E assim cerrarei meus olhos,
num último adeus, sem palavras
ou gestos de ternura de outrem.
E ficará de mim apenas tudo o que
eu quis dizer, mas não o fiz
por não poder ou não querer.
Enfim, este (recomeço) é o fim.
Despeço-me de todos sem saber
se haverá amanhã (ao menos para mim).
Escrevam em minha lápide que fui feliz.
Não, melhor: escrevam que tive muitos
momentos de felicidade. Instantâneos.
Mateus Almeida Cunha
Ouvindo a canção “Años” com Mercedes Sosa e Pablo Milanés.
Aviso: este não é um último poema!